"O menor caminho entre sua empresa e o Sucesso"
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A responsabilidade tributária dos sócios e administradores das sociedades
Em se tratando de contribuintes pessoas jurídicas, como as sociedades empresárias, tem-se que, como regra geral, a responsabilidade tributária deve ser suportada pelo seu patrimônio próprio, não devendo resvalar no patrimônio dos sócios.
No Direito Tributário, contribuinte é a pessoa física ou jurídica que realiza o fato gerador da obrigação e que deve arcar com o pagamento do tributo.
Em se tratando de contribuintes pessoas jurídicas, como as sociedades empresárias, tem-se que, como regra geral, a responsabilidade tributária deve ser suportada pelo seu patrimônio próprio, não devendo resvalar no patrimônio dos sócios.
Não obstante, verifica-se que, com bastante freqüência, as Fazendas Públicas buscam responsabilizar os sócios e administradores das sociedades pela obrigação tributária, mormente na hipótese de encontrar obstáculos para a execução fiscal do tributo devido em relação à contribuinte que praticou o fato gerador.
Contudo, verifica-se que, na prática, comumente a pretensão das Fazendas em responsabilizar terceiros por obrigações tributárias não encontra respaldo no ordenamento jurídico, sendo movida unicamente por interesses arrecadatórios.
É princípio elementar do Direito a separação do patrimônio da empresa do patrimônio de seus sócios. Afinal, uma das razões pelas quais as empresas são estruturadas sob a forma de pessoa jurídica é para resguardar o patrimônio pessoal dos sócios.
O desenvolvimento das sociedades capitalistas vincula-se ao instituto da personalidade jurídica, uma vez que a livre iniciativa precisa ser incentivada pela separação patrimonial entre a pessoa física e seu empreendimento, e a limitação dos riscos da atividade econômica dentro de limites pré-estabelecidos, para fomentar o empreendedorismo.
Desta forma, faz-se necessário analisar os pressupostos para que esta responsabilidade possa extravasar a sociedade para atingir seus sócios ou administradores, principalmente com o intuito de resguardar o princípio da preservação da empresa.
É preciso delimitar interpretativamente o alcance das normas que possibilitam que a responsabilidade tributária atinja os sócios e administradores, e isto deve ser feito por meio de uma análise conjunta do ordenamento jurídico, com enfoque tanto no Direito Tributário quanto no Empresarial, com vistas a proteger o instituto da sociedade empresária contra deturpações interpretativas, e também de defender, no aspecto prático, as pessoas a quem a Fazenda Pública procura responsabilizar tributariamente.
A separação patrimonial decorrente da personalidade jurídica
Preceitua o Código Civil, em seu artigo 1º, que "Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil". Desta forma, conclui-se que sujeito jurídico é aquele que exerce direitos e tem obrigações a cumprir. O atributo da personalidade é conferido pelo próprio ordenamento jurídico.
Anteriormente, apenas a pessoa física possuía personalidade. Contudo, por necessidade da sociedade cada vez mais complexa, o Direito passou a considerar como sujeitos de direito agrupamentos de pessoas que se uniam para alcançar objetivos comuns, atribuindo-lhes personalidade jurídica. Da evolução deste conceito surgiu o que atualmente se compreende por pessoa jurídica, em contraposição com pessoa natural.
Para constituir uma sociedade, duas ou mais pessoas naturais ou jurídicas que queiram se associar celebram um contrato plurilateral, entre si, e, sendo o caso das sociedades empresárias, o intuito deste agrupamento será realizar atividade econômica com intuito de lucro.
Como determina o art. 985 do Código Civil de 2002, através da inscrição em registro próprio a sociedade adquire personalidade jurídica. Seus atos constitutivos são arquivados na Junta Comercial, no caso de sociedades empresárias, ou, sendo sociedades não empresárias, o registro será feito junto ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas.
É a partir do registro que as sociedades passam a existir legalmente como pessoa jurídica de direito privado, inserem-se no âmbito jurídico, deixando de existir somente como organismo econômico, dotando-se de direitos e obrigações e sendo possuidoras de um patrimônio distinto do de seus sócios.
Após a personificação, a sociedade passa a ter a existência diferenciada de seus sócios, ou seja, a personalidade jurídica confere autonomia à sociedade. Os principais efeitos decorrentes da personificação são a aquisição de patrimônio próprio, de nome, nacionalidade e domicílio próprios.
É a personalidade que torna a pessoa titular de direitos e de obrigações, participante efetiva do ordenamento jurídico e responsável pela prática de todos os seus atos. Os arts. 11 a 21 do Código Civil tratam dos direitos da personalidade, cuja proteção aplica-se tanto às pessoas naturais como às pessoas jurídicas.
Conforme ensina Orlando Gomes, pessoas jurídicas são "entes formados pelo agrupamento de homens, para fins determinados, que adquirem personalidade distinta das dos seus membros. Reconhece-lhes, a lei, capacidade de ter direitos e contrair obrigações." (1) Assim, percebe-se que a pessoa jurídica pode ser caracterizada como a união de pessoas na busca de um objetivo comum ou como a destinação de um patrimônio para determinado fim.
A pessoa jurídica é um ente autônomo e independente da pessoa de seus membros, podendo emitir sua própria vontade e defender seus próprios interesses. Com vontade e patrimônio próprios, a pessoa jurídica é sujeito de direito, podendo contrair e exercer direitos e adquirir obrigações, sempre de forma autônoma.
A pessoa jurídica é um instrumento, uma técnica jurídica que visa a alcançar determinados fins práticos, como a autonomia patrimonial e a limitação de responsabilidades (2) , constituindo-se num centro autônomo de interesses, direitos e responsabilidades. A personalidade jurídica é qualidade inerente à pessoa jurídica, sendo determinante para o reconhecimento desta perante o ordenamento jurídico.
Fábio Ulhoa COELHO (3) discorre sobre o conceito de pessoa jurídica:
O instituto da pessoa jurídica é uma técnica de separação patrimonial. Os membros dela não são os titulares dos direitos e obrigações imputados à pessoa jurídica. Tais direitos e obrigações formam um patrimônio distinto do correspondente aos direitos e obrigações imputados a cada membro da pessoa jurídica.
O Direito brasileiro adota a teoria da realidade técnica na disciplina legal da matéria, pois determina que a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado começa com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo, como consta no art. 45 do Código Civil.
AMARAL (4) explica essa teoria, segundo a qual "as pessoas jurídicas são uma realidade, não ficção, embora produto da ordem jurídica. Sendo a personalidade, no caso, um produto da técnica jurídica, sua essência não consiste no ser em si, mas em uma forma jurídica (...), que é a tradução jurídica de um fenômeno empírico".
Em relação à constituição da pessoa jurídica, ensina a doutrina de AMARAL (5):
A formação da pessoa jurídica exige elementos de ordem material, basicamente, uma pluralidade de pessoas, um conjunto de bens e uma finalidade específica, e elementos de ordem formal, que são um estatuto e o seu registro no órgão competente.
Portanto, a pessoa jurídica possui a necessidade de estar revestida de uma personificação para existir formalmente e ser sujeito de direito e deveres. Porém, a lei prevê a possibilidade de existência de pessoa jurídica não personificada quando se verifica a ocorrência do affectio societatis e do exercício de fato na atividade societária, mas não a constituição formal da empresa. Se mais de uma pessoa trabalha de forma conjunta, unindo esforços e patrimônio para alcançar um mesmo fim, estão agindo em sociedade, e, em razão disto, são sujeitos de deveres e direitos próprios que são regidos pelas normas das sociedades simples, descrita no art. 986 do Código Civil. Por não terem formalizado a empresa e, conseqüentemente, por não terem atribuído competências e limitado responsabilidades, todos os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais, como consta no art. 990 do Código Civil.
Como se verifica, as sociedades de fato não possuem o atributo da personalidade jurídica, pois, de acordo com a lei, é necessário que a pessoa jurídica tenha registro próprio e adequado. Portanto, as sociedades de fato, na medida em que infringem as exigências legais para concessão da personalidade jurídica, não usufruem de suas prerrogativas.
É possível constatar que a característica primordial da pessoa jurídica é a autonomia em relação às pessoas naturais que a compõem. As pessoas jurídicas não se confundem com as pessoas naturais que a integram, mesmo sendo seus sócios e administradores, que agem diretamente em nome daquela. Quando a pessoa jurídica adquire bens de terceiros, é o administrador quem assina o contrato de compra e venda e que assina o cheque, mas é a manifestação de vontade da pessoa jurídica que é concretizada. É a pessoa jurídica quem adquire a propriedade.
A personificação possui diversos efeitos práticos, dentre os quais se destacam (6) :
a) a pessoa jurídica é um ente autônomo em relação às pessoas naturais que o constituem
b) a pessoa jurídica constitui um novo foco de direitos e deveres, dotado de capacidade de direito e de fato, e de capacidade para postular em juízo;
c) o destino econômico da pessoa jurídica é diferente do destino econômico dos seus membros participantes;
d) a autonomia patrimonial da pessoa jurídica faz com que não se confundam o patrimônio desta com o de seus membros;
e) as relações jurídicas da pessoa jurídica são independentes das de seus membros, existindo a possibilidade de se firmarem relações jurídicas entre a pessoa jurídica e um ou mais de seus membros;
f) a responsabilidade civil da pessoa jurídica é independente da responsabilidade de seus membros;
Se o patrimônio da sociedade é autônomo, os credores dos sócios só poderão satisfazer a obrigação sobre o patrimônio do sócio, enquanto os credores da sociedade deverão buscar a satisfação no patrimônio da sociedade. Como bem acentua AMARAL:
"Essa independência revela-se no patrimônio, nas relações jurídicas e na responsabilidade civil, sabido que o novo ente não responde pelos atos de seus membros, nem estes por atos daquele, salvo expressa disposição legal ou contratual." (7)
Como os atos praticados em nome da pessoa jurídica são, necessariamente, efetivados pelas pessoas naturais que a constituem, é possível que não poucas vezes a personalidade jurídica possa ser usada como uma máscara para encobrir atos ilícitos ou abuso de direitos, havendo hipóteses em que o patrimônio dos sócios pode ser alcançado para saldar débitos civis ou tributários da pessoa jurídica.
Sujeição passiva no código tributário nacional
Como se infere do art. 121 do Código Tributário Nacional, existem dois tipos de sujeitos passivos da obrigação principal, quais sejam: o contribuinte e o responsável tributário.
De acordo com o inciso I do mesmo artigo, trata-se de contribuinte, "quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador". Já de acordo com o seu inciso II, trata-se de responsável, "quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei".
No art. 128 do CTN há uma definição mais precisa de responsabilidade tributária. Dispõe o artigo que "a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação".
É importante ressaltar que o responsável é um terceiro em relação ao contribuinte, mas não alheio ao fato gerador, até porque nas sociedades empresárias, como destaca Amador Paes de Almeida, a pessoa jurídica não é senão um instrumento para a satisfação das necessidades humanas, dirigida pelas pessoas físicas de seus respectivos sócios, que devem imprimir, em sua direção, todas as cautelas necessárias (8) . Seus sócios e administradores, portanto, estão intimamente ligados com o fato gerador da obrigação tributária.
Depreende-se do Código Tributário Nacional que a responsabilidade pode ser, conforme o caso, por sucessão, regulada pelos artigos 129 e 133; de terceiros, regulada pelos artigos 134 e 135; por substituição, regulada pelo artigo 128; e por infrações, regulada pelos artigos 136 a 138.
Já o art. 124 trata da obrigação tributária, que, embora não seja um tipo de responsabilidade tributária, permite que a obrigação tributária atinja mais de uma pessoa.
A diferença substancial entre a responsabilidade tributária e a solidariedade é que a primeira tem o efeito de excluir a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo. Lado outro, a solidariedade tem como traço marcante a distribuição da responsabilidade tributária para mais de uma pessoa, que também terá a qualidade de contribuinte, sendo que não há benefício de ordem entre eles.
Em suma, pelo CTN o responsável tributário assume essa condição ou por substituição, substituindo aquele que deveria se naturalmente o contribuinte, por diversos motivos previsto em lei; ou por transferência, recebendo o dever de pagar o tributo antes atribuído ao contribuinte, o qual não pode ou não deve satisfazer a prestação (9) .
Mas o objetivo que se tem em foco é analisar especificamente a responsabilidade de terceiros, contida nos artigos 134 e 135 do CTN. Responsabilidade esta que "deve ser examinada diante do inadimplemento da obrigação principal e diante da impossibilidade da exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte" (10) ., bem como a responsabilização em decorrência da solidariedade tributária, que também tem sido frequentemente utilizada pela Fazenda Pública para tentar imputar aos sócios a responsabilidade pelos débitos tributários da pessoa jurídica.
A indevida generalização da responsabilidade tributária
O exercício da advocacia contenciosa na esfera tributária, principalmente no que se refere à defesa de sociedades empresárias em execuções fiscais, revela que as Fazendas Públicas buscam, indiscriminadamente, responsabilizar os sócios e administradores das pessoas jurídicas por débitos tributários cujos sujeitos passivos são as empresas, enquanto entes dotados de personalidade jurídica.
Para fundamentar seu intento, valem-se, indiscriminadamente, do disposto nos artigos 124, 134 e135 e do Código Tributário Nacional, os quais preceituam:
Art. 124. São solidariamente obrigadas:
I - as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal;
(...)
Parágrafo único. A solidariedade referida neste artigo não comporta benefício de ordem.
Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:
(...)
VII - os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:
I - as pessoas referidas no artigo anterior;
(...)
III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
Embora os citados artigos tragam situações em que a responsabilidade tributária extrapola a pessoa que é contribuinte do tributo, a interpretação destas normas deve ser adequada, e não deve ser estendida arbitrariamente no intuito de alcançar os sócios e administradores de empresas de uma forma genérica.
O intento das Fazendas Públicas, apesar de equivocado, não seria preocupante se não estivesse sendo acolhido pela jurisprudência. Alguns julgados do Tribunal de Justiça de Minas Gerais espelham, exemplificativamente, como os referidos dispositivos legais estão sendo interpretados de forma inadequada pelos tribunais.
Em relação ao art. 134, VIII, tem-se entendido, equivocadamente, que tal dispositivo possibilita que qualquer sócio da empresa - seja ele sócio gerente ou não -seja responsabilizado pelos débitos da pessoa jurídica se tiver ocorrido o encerramento das atividades empresariais. E isto sem que se questione tratar-se a empresa de uma sociedade de pessoas ou de capital:
EXECUÇÃO FISCAL CONTRA SOCIEDADE - INEXISTÊNCIA DE BENS DA SOCIEDADE - REDIRECIONAMENTO DA COBRANÇA CONTRA OS SÓCIOS - RESPONSABILIDADE - ART. 134, VII E 135 DO CTN - INEXISTÊNCIA DE PROVA DE ESTAR A EMPRESA EM PLENA ATIVIDADE - REDIRECIONAMENTO AOS SÓCIOS CABÍVEL. O sócio-gerente de uma sociedade limitada pode ser responsabilizado pelos pagamentos não efetuados pela sociedade nos termos dos arts. 134 e 135 do CTN; Permite-se o redirecionamento da ação de execução fiscal ao sócio que encerrou as atividades da empresa sem quitação dos tributos (art. 134, VII, do CTN) ou se praticou algum dos fatos previstos no art. 135 do CTN. (TJMG Proc.: 1.0024.05.861432-2/001(1) Num. Única: 8614322-52.2005.8.13.0024 Rel.: VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE Julg.: 04/12/2007, Publicação: 26/02/2008
EXECUÇÃO FISCAL. EMPRESA DEVEDORA NÃO ENCONTRADA. PRESUNÇÃO LEGAL (RELATIVA) DE DISSOLUÇÃO IRREGULAR DAS ATIVIDADES. REDIRECIONAMENTO DA AÇÃO SOBRE A FIGURA DO SÓCIO. INTELIGÊNCIA DO ART. 134, CTN. RECURSO PROVIDO. (TJMG proc.: 1.0024.07.409645-4/001(1) Num. Única: 4096454-21.2007.8.13.0024 Rel.: FERNANDO BRÁULIO Julg. 18/12/2008 Public. 13/03/2009 parte: FARMAPRESS MEDICAMENTOS LTDA )
Trecho do Acórdão
Destarte, a liquidação irregular da pessoa jurídica, ante a presunção - relativa - introduzida na Lei estadual de regência, acarreta a responsabilização dos tributos devidos por ela sobre a figura dos sócios, quaisquer eles, tenham ou não poder de gerência, à luz do que dispõe o art. 134, do CTN.
Ocorre que, como será demonstrado, o art. 134, VIII do CTN só permite a responsabilização dos sócios no caso de liquidação da empresa que seja sociedade de pessoas, não podendo tal dispositivo ser aplicado em sociedade de capitais. Não obstante, nem a Fazenda Pública e nem a jurisprudência atentam para esta particularidade.
Acerca do art. 135, III, do CTN, a jurisprudência possui o entendimento errôneo de que o não pagamento do tributo pela empresa seria capaz de originar a responsabilidade dos sócios por constituir violação à lei:
EXECUÇÃO FISCAL - INCLUSÃO DO NOME DE SÓCIO GERENTE NO PÓLO PASSIVO DA EXECUÇÃO - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA - POSSIBILIDADE - ART. 135, III, DO CTN - Nos termos do art. 135, III, do CTN os sócios-gerentes respondem pessoalmente pelas obrigações tributárias da sociedade resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei; assim, também, o não pagamento de tributo constitui violação à lei, que origina a responsabilidade dos sócios. (TJMG proc. 1.0596.06.034597-9/001(1) Num. Única: 0345979-23.2006.8.13.0596 Rel. Schalcher Ventura Julg. 30/08/07 Public: 21/09/07
AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO FISCAL - EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE -DIREITO TRIBUTÁRIO - NÃO PAGAMENTO DE ICMS - INDICAÇÃO DE COOBRIGADO NA CDA -RESPONSABILIDADE PESSOAL DO SÓCIO - CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL, ARTIGO 135, INCISO III - MATÉRIA QUE, ""IN CASU"", DEMANDA DILAÇÃO PROBATÓRIA E QUE DEVE SER DEDUZIDA EM DEFESA, VIA EMBARGOS - AGRAVO PROVIDO. A Exceção ou Objeção de Pré-Executividade, oriunda de construção doutrinária e jurisprudencial, somente tem sido admitida em casos excepcionais, quando há irregularidade flagrante no título executivo ou a matéria admitir conhecimento de ofício. O sócio de sociedade por cotas de responsabilidade limitada tem o dever legal de recolher tributo devido. O seu não pagamento constitui infração à lei, sendo possível recair sobre o sócio a responsabilidade pelos débitos fiscais da empresa, nos termos do artigo 135, III, do Código Tributário Nacional. Estando indicado, na Certidão de Dívida Ativa, o nome de coobrigado, é admissível, contra ele, o redirecionamento da execução fiscal. Indevida a exclusão de coobrigado do pólo passivo de feito executivo fiscal, em sede da demandada excepcionalidade da Exceção, por imprescindir de dilação probatória, com observância ao contraditório e à ampla defesa, devendo ser articulada e elucidada a questão em sede de Embargos, com cognição ampla, possibilitando ao agravado larga oportunidade de demonstrar a sua inocência fiscal. Agravo provido. (TJMG proc. 1.0105.98.003493-5/001(1) Numeração Única: 0034935-79.1998.8.13.0105 Rel.: EDUARDO ANDRADE Julg.: 21/02/2006 Public.: 07/04/2006
Não obstante, será evidenciado que o mero não pagamento de tributos não é capaz de constituir fato apto a responsabilizar os sócios pelos débitos da sociedade.
Os tribunais também interpretam o art. 124 de forma equivocada, imputando aos sócios a responsabilidade tributária sob argumento de que eles possuem interesse comum ao fato gerador da obrigação tributária:
EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL - REDIRECIONAMENTO DA AÇÃO À COOBRIGADA - POSSIBILIDADE - ALEGADA PRESCRIÇÃO - INOCORRÊNCIA - IMPENHORABILIDADE DE PEQUENO IMÓVEL RURAL. Lançar na CDA a relação dos sócios gerentes, coobrigados é direito assegurado ao exeqüente, nos termos do art. 2º, § 5º, I e § 6º, da Lei de Execução Fiscal, constituindo, inclusive, requisito essencial à formação título executivo, à constatação da solidariedade, por interesse comum com os negócios da sociedade empresarial, sobretudo porque expressamente designados como tais por lei (art. 124, I, do CTN), conforme responsabilidade que lhes é atribuída pelo art. 134, III, do CTN. ·Constando o nome da sócia gerente em Certidão de Dívida Ativa assegura-se à Fazenda condições de viabilidade para lhe redirecionar ação, porquanto, como tal, está legitimada passiva para a relação processual executiva - CPC art. 568, I - muito embora não se lhe confirma a sua responsabilidade tributária, a não ser por presunção relativa (CTN, art. 204), matéria de direito material - art. 135 do CTN - a ser decidida pelas vias cognitivas próprias. (...)·(TJMG 1.0702.07.413087-4/001(1) Num Única: 4130874-55.2007.8.13.0702 Rel. Eduardo Andrade Julg. 04/08/09 Public. 28/08/09)
Ocorre que o sócio não pode ser considerado obrigado solidário pelas dívidas da sociedade, posto que não possui interesse nos negócios da sociedade, visto que o termo interesse utilizado pela lei não se trata de interesse econômico, e sim jurídico, como será adiante explicitado.
Desta forma, é possível constatar que o Judiciário não está interpretando adequadamente os artigos 124, 134 e 135 do CTN. A conseqüência disso é a injusta imputação de responsabilidade tributária aos sócios das pessoas jurídicas, incluindo-se as sociedades empresárias.
Responsabilidade tributária no art. 134 do CTN
De acordo com o art. 134, ocorrerá responsabilidade subsidiária dos sócios em casos de liquidação de sociedade de pessoas. Desta forma, na impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal, os sócios se tornam responsáveis subsidiários do crédito tributário.
Ou seja, só haverá responsabilidade tributária dos sócios após restar comprovado que a pessoa jurídica não possui bens suficientes para efetuar o pagamento da dívida, e, além disso, somente em relação aos atos ou omissões nos quais foram efetivamente responsáveis. De fato, a doutrina de Hugo de Brito Machado é neste sentido:
A responsabilidade de terceiros, prevista no art. 134 do CTN, pressupõe duas condições: a primeira é que o contribuinte não possa cumprir sua obrigação, e a segunda é que o terceiro tenha participado do ato que configure o fato gerador do tributo, ou em relação a este se tenha indevidamente omitido. (...) É preciso que exista uma relação entre a obrigação tributária e o comportamento daquele a quem a lei atribui a responsabilidade. (11)
Apesar do CTN afirmar expressamente que existe responsabilidade solidária, vê-se que, na verdade, esta responsabilidade é subsidiária, ou seja, o sócio só será responsabilizado se a empresa não tiver como pagar o tributo. Existe, no caso, um benefício de ordem, que impede a execução do sócio na hipótese da sociedade ter patrimônio para honrar a dívida. Cumpre salientar que, neste caso, não há responsabilidade pelas penalidades que não sejam de caráter moratório.
Para que ocorra a incidência do art. 134, VII, CTN, e seja possível a responsabilidade solidária do sócio é indispensável a prova de ato comissivo ou omissivo quanto ao não pagamento do tributo, além da demonstração de ter sido frustrada a tentativa de localizar-se bens de propriedade da pessoa jurídica para garantir o crédito tributário em juízo. Neste sentido, enfatiza Hugo de Brito Machado:
"A responsabilidade de terceiros, prevista no art. 134 do CTN, pressupõe duas condições: a primeira é que o contribuinte não possa cumprir sua obrigação, e a segunda é que o terceiro tenha participado do ato que configure o fato gerador do tributo, ou em relação a este se tenha indevidamente omitido.
(...)
É preciso que exista uma relação entre a obrigação tributária e o comportamento daquele a quem a lei atribui a responsabilidade." - (Curso de Direito Tributário. 27ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 176).
Frise-se que, quando a lei menciona sociedades de pessoas, não contempla as sociedades de capital, dentre as quais as sociedades anônimas.
São sociedades de pessoas aquelas em que a realização do objeto social depende fundamentalmente dos atributos individuais dos sócios. Os atributos das pessoas dos sócios sao mais importantes que sua contribuição material para a sociedade. Inclusive, como as qualidades dos sócios podem interferir na realização do objeto social, o ingresso de um novo sócio está condicionado à aceitação dos demais, pois os interesses dos outros sócios podem ser afetados. As sociedades em nome coletivo e em comandita simples são de pessoas. A sociedade limitada pode ser de pessoas ou de capital.
Por outro lado, nas sociedades de capitais os atributos dos sócios sao irrelevantes para o sucesso ou insucesso da empresa explorada pela sociedade. Quando uma pessoa adquire uma ação de uma sociedade anônima, as qualidade subjetivas desse acionista não interferem de forma nenhuma com o desempenho da sociedade. O único fator a considerar é a contribuição material dada para a sociedade. O sócio pode alienar sua participação societária a quem quer que seja, independentemente da anuência dos demais. As sociedade anônimas e em comandita por ações são sempre de capital.A sociedade limitada pode ser ou não de capital.
Contudo, importante repisar que, muitas vezes, a Fazenda Pública busca generalizar a responsabilidade dos sócios em caso de liquidação da sociedade, sem fazer diferença se a sociedade é de pessoas ou de capital: simplesmente utiliza o art. 134 do CTN para responsabilizar os sócios por débitos tributários no caso da sociedade não ser mais encontrada em seu endereço.
Não obstante, é preciso atentar para a disposição expressa contida na lei de que a responsabilidade dos sócios está bem delimitada pelo art. 134: apenas nas sociedades de pessoas é que tal responsabilidade subsiste, não podendo atingir sociedades de capital.
Responsabilidade tributária no art. 135 do CTN
Conforme preceitua o art. 135, III, do CTN, os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de Direito Privado são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultante de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. Verifica-se, portanto, que a responsabilidade tributária, nesta circunstância, é diretamente transferida para os sócios, até mesmo liberando a pessoa jurídica da obrigação.
No caso, responsabilidade torna-se pessoal e exclusiva dos sócios, mas isto somente ocorrerá quando ficar provado que o sócio praticou atos com excesso de poder, infração á lei, contrato social ou estatuto, ou seja, se houve ação realizada com má-fé objetivando lesar o fisco. Caso estas condutas não tenham sido comprovadas, a responsabilização pelo pagamento do tributo não pode persistir.
Embora a lei tenha explicitado as hipóteses de responsabilidade tributária dos sócios, a Fazenda Pública, com a chancela de muitos magistrados, tem buscado ampliar demasiadamente as circunstâncias que caracterizam a responsabilidade, realizando interpretação equivocada e tendenciosa do art. 135, III, com o fito de generalizar a responsabilidade tributária dos sócios. Apesar de ocorrer frequentemente, tal procedimento não pode acontecer da forma indiscriminada como normalmente ocorre, sob pena de ferimento á lei tributária.
Nas execuções fiscais ajuizadas contra pessoas jurídicas, a Fazenda Pública busca responsabilizar os sócios das empresas, seja já incluindo seus nomes na Certidão de Dívida Ativa, ajuizando ação em litisconsórcio passivo, ou requerendo o redirecionamento da execução fiscal contra estes sócios, requerendo a inclusão destes no pólo passivo da lide durante o curso do processo. O argumento da Fazenda Pública consiste na afirmativa de que o não pagamento de um tributo, por si só caracteriza infração á lei e ao contrato social, o que autorizaria a responsabilidade tributária dos sócios das empresas.
Logicamente, a assertiva da Fazenda não é verdadeira, pois o atraso ou o não pagamento do tributo não pode ser considerado como infração à lei ou ao contrato social praticada pelo sócio, sob o simples, mas invencível argumento de que, se assim não o fosse, não haveria hipótese de exceção, ou seja, sempre o sócio seria responsável pelo débito tributário.
A intenção do legislador foi justamente criar uma circunstância de exceção para se configurar a responsabilidade do sócio, e não colocá-la como regra geral. Afinal, o direito pátrio separa a pessoa jurídica e a pessoa física, não podendo suas responsabilidades ser confundidas sob pena de se destruir um dos importantes pilares da ciência jurídica, que é a autonomia da pessoa jurídica como um ente próprio, que se destaca da pessoa de seus sócios. Esta criação do direito surgiu justamente no intuito de fomentar a atividade econômica, e restringi-la em excesso pode prejudicar o seu desenvolvimento, em virtude da criação da imposição de grave ônus aos sócios.
A pessoa jurídica é um ente autônomo e independente da pessoa de seus membros, podendo emitir sua própria vontade e defender seus próprios interesses. Com vontade e patrimônio próprios, a pessoa jurídica é sujeito de direito, podendo contrair e exercer direitos e adquirir obrigações, sempre de forma autônoma. É regra em nosso ordenamento jurídico que as pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros, e a possibilidade de se desconsiderar esta distinção é uma exceção.
Não se pode negar que o não pagamento do tributo seja infração á lei, mas esta infração é praticada pela pessoa jurídica, e não pela pessoa dos sócios. Desta forma, ainda que haja infração á lei pelo não pagamento do tributo, para que haja a correta aplicação do art. 135, é necessário perscrutar quem infringiu a lei, se foi a pessoa jurídica ou se foram os sócios.
Os sócios apenas praticam ilícitos ao atuarem além de suas competências, ou seja, se sua atuação for própria e pessoal, não se caracterizando como um ato da empresa. Assim, os sócios somente podem ser responsabilizados quando ultrapassarem os limites de seus atos normais como gerentes, infringindo as normas societárias e as do contrato social que regulam a abrangência de sua atuação.
Ademais, o simples inadimplemento da obrigação tributária, mesmo em se tratando de tributo declarado e não pago pelo contribuinte, não faz presumir a prática pelo sócio-gerente dos ilícitos previstos no art. 135 do CTN, e tampouco constitui o não-pagamento, por si só, o próprio ilícito.
Desta forma, o simples descumprimento da obrigação tributária não configura "infração de lei" prevista no art. 135 do CTN, uma vez que a referida "infração de lei" não se refere à infração de norma tributária, mas sim de norma civil e comercial.
A propósito, os pertinentes comentários de José Otávio de Vianna Vaz (12) :
"Ressalte-se, ainda, que a palavra 'lei' utilizada no art. 135 está ao lado das expressões 'excesso de poderes' e 'infração do contrato social ou estatutos', expressões típicas do direito societário, regulado pelas legislações civil e comercial. Nestes termos, entendemos que a 'infração de lei' em comento diz respeito não à lei tributária - de resto, tratada de forma ampla nos arts. 136 e 137 - mas à infração da legislação civil e comercial."
O sócio será responsabilizado, neste quesito, somente na hipótese de praticar atos ilícitos além de suas funções, contrariando a lei societária e as suas atribuições estabelecidas no contrato social, ou seja, quando age por si mesmo, e não em nome da sociedade. Por exemplo, se o tributo não é pago para que o seu valor seja reinvestido na empresa ou utilizado para pagar fornecedores, a responsabilidade é da sociedade; lado outro, se o tributo não é pago para seu valor ser desviado para os sócios, a responsabilidade é deles.
O principal pressuposto para a responsabilidade tributária de sócios-gerentes, diretores e administradores das pessoas jurídicas de direito privado reside no dolo. Imprescindível a comprovação do intuito precípuo em fraudar a lei ou contrato social para auferir vantagem indevida, posto que o art. 135 não traz hipótese de responsabilidade objetiva.
A atribuição da responsabilidade pelo crédito tributário a terceiro é sempre excepcional, e por isto as normas devem ser interpretadas com cautela, evitando sua ampliação, notadamente por ser o direito tributário pautado pela legalidade estrita, não admitindo extensões e analogia.
Assim dispõe Hugo de Brito Machado (13) sobre a regra da limitação da responsabilidade dos sócios da pessoa jurídica:
"É importante notar-se que a responsabilidade dos sócios-gerentes, diretores e administradores de sociedades, nos termos do art. 135, III do CTN, é por obrigações resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. Poder-se-ia, assim, sustentar que a obrigação, pela qual respondem, há de ser resultante de atos irregularmente praticados. O próprio nascimento da obrigação tributária já teria de ser em decorrência de atos irregulares."
Não é todo o crédito tributário que pode ser exigido de terceiros, mas apenas aquele decorrente de obrigações tributárias resultante de atos praticados com excesso de poderes, ou infração de lei, contrato social ou estatutos. O abuso ou ilegalidade pode também residir não só em créditos gerados de atos viciados, mas também de atos anteriores ao crédito, os quais levaram á insolvência da empresa, impedindo o pagamento de tributos.
Importante ressaltar que o art. 135, III do CTN prevê responsabilidade dos sócios desde que tenham poderes de gerência ou direção da sociedade, visto que a responsabilidade decorre do poder de gerência, não da qualidade de ser sócio. No caso de pessoas jurídicas cuja responsabilidade dos sócios tem limitação, como as sociedades por cotas de responsabilidade limitada e as sociedades anônimas, estes somente respondem pelo débito tributário em circunstâncias específicas, seja de acordo com os preceitos do art. 135 ou no limite da integralização do capital social ou do valor das ações.
Como o art. 135 prevê a possibilidade de haver responsabilidade dos representantes legais, conclui-se que apenas o sócio-gerente pode ser responsabilizado, excluindo-se o sócio não-gerente, que não tem poderes de decisão na empresa. De fato, o sócio não gerente não pode arcar com a responsabilidade tributária, visto que não tem poder para praticar atos geradores de responsabilidade.
Existe uma dissonância doutrinária e jurisprudencial nos casos de execuções fiscais movidas contra os sócios em litisconsórcio passivo com as empresas e quando a execução é redirecionada posteriormente contra eles.
Há quem entenda que, caso já seja movida a execução também contra o sócio, tendo seu nome incluído na Certidão de Dívida Ativa, a responsabilidade de provar que não tenha agido com excesso de poderes, infração à lei ou ao contrato social seria ônus do sócio, em virtude de ter a CDA presunção de veracidade. Lado outro, se a execução fosse posteriormente direcionada contra o sócio, o ônus de provar o cometimento de ato ilícito seria da Fazenda.
Correto o entendimento que, em caso de redirecionamento da execução contra o sócio, tenha a Fazenda o ônus de provar o cometimento de circunstância autorizadora de responsabilidade pessoal, antes que o redirecionamento seja deferido. Ressalte-se que a prova deve ser feita previamente pela Fazenda antes do redirecionamento, sob pena de infração á lei, visto que o art. 135 permite a execução do responsável tributário, e não do sócio.
O sócio só se transforma em responsável tributário após a prova de cometimento de ato ilícito, e por isto, a execução só pode ser redirecionada contra ele após a produção desta prova. Ajuizar ação contra o sócio, pura e simplesmente, é infringir o art. 135, visto que este não autoriza execução contra sócio, só autoriza execução contra o responsável tributário.
Pertinente a reflexão sobre ser possível ou não o redirecionamento de execução contra sócio cujo nome não conste na Certidão de dívida ativa, visto que o art. 202 do CTN preceitua que o nome dos executados e co-obrigado deve constar da CDA, sob pena de sua nulidade. O melhor entendimento é no sentido da necessidade da Fazenda substituir a CDA para fazer incluir o nome do sócio, após provar a sua responsabilidade tributária, sendo que a substituição é autorizada pela Lei 6830/80, no art. 2º, § 8º, sempre assegurando ao executado o prazo para Embargos.
Em relação á propositura de execução fiscal diretamente contra o sócio, em virtude de seu nome já estar na Certidão de dívida Ativa, entendemos que tal só pode ser admitido com importante ressalva: prévia apuração de responsabilidade no processo administrativo.
Embora a CDA tenha presunção de veracidade, esta presunção somente subsiste em virtude desta estar apoiada em um prévio processo administrativo. Assim, a responsabilidade tributária deve ficar provada, pela Fazenda Pública, neste processo administrativo, no qual deve ser assegurado o contraditório e ampla defesa ao sócio, que deve ser pessoalmente notificado para apresentar defesa. A responsabilidade tributária não pode ser apoiada em uma presunção, mas somente em provas concretas, cujo ônus é de quem as alega, da Fazenda Pública, seja no processo administrativo ou no processo judicial, mas sempre antes de se proceder a citação do sócio no executivo fiscal.
Inquestionável que cabe unicamente à Fazenda Pública o ônus da prova acerca de atos ilegais/irregulares porventura praticados pelo sócio que acarretariam a sua responsabilidade pessoal, pois a inclusão do mesmo no pólo passivo da execução fiscal só deve proceder-se após a apresentação destas provas, que são de incumbência da parte que sustenta a alegação, pois é norma do Direito que a presunção é sempre pela inocência, no caso, pelo correto procedimento do sócio.
Ademais, em termos práticos, é inviável a produção de prova, pelo sócio, de que toda a sua gestão foi regular, pois teria que apresentar vastíssima quantidade de documentos, e ainda assim, a prova não seria possível, visto que não há como produzir, em termos gerais, prova de que não se cometeu ato ilícito ou irregularidade.
O Colendo Superior Tribunal de Justiça entendia que era dever das Fazendas Públicas produzir a prova de que os sócios teriam praticado algum ato ilícito ou abusivo para que a responsabilidade tributária destes fosse caracterizada.
Não obstante, o próprio Superior Tribunal de Justiça, em decisão da ministra Denise Arruda, relatora no Recurso Especial 1.104.900/ES, recentemente modificou completamente o entendimento anterior sobre o tema e determinando que, doravante, o ônus de provar a sua inocência cabe ao próprio sócio, administrador ou gestor. Aplicou inclusive a sistemática do recurso repetitivo, valendo dizer que toda e qualquer discussão acerca do artigo 135 CTN terá que ter aquele acórdão como paradigma.
O ônus de provar a prática do ato excessivo, sempre foi da Fazenda Pública, através de fiscalização eficiente, pois fazer uma prova negativa é a prova mais difícil dentro do ordenamento jurídico.
Com a nova orientação jurisprudencial que, a situação tende a se agravar. Dificilmente os responsáveis por uma sociedade sairão ilesos da injusta cobrança dos débitos tributários em atraso, em virtude da grande dificuldade de fazer prova negativa quanto à prática de uma ilicitude que sequer chegou a lhe ser imputada.
A presunção de liquidez e certeza do crédito tributário é resultante de um procedimento administrativo fiscal onde é garantido ao sujeito passivo o contraditório e a ampla defesa. Portanto, a Fazenda Pública só poderia constituir o seu próprio título executivo se este for extraído de um procedimento administrativo, submetido a todas as garantias constitucionais processuais, sob pena de lesão à Constituição da República, que garante o direito ao contraditório e à ampla defesa tanto em processos administrativos quanto em processos judiciais.
A Constituição também determina que toda pessoa deve ser considerada inocente até que se prove o contrário. Deste modo, essa prova é exclusiva de quem alega ou imputa um fato a outrem, vale dizer, sempre da Fazenda Pública. Ao exigir do suposto responsável tributário a prova negativa da inexistência de ilicitude, o Superior Tribunal de Justiça acaba por estabelecendo uma responsabilização tributária objetiva sem amparo na legislação. Mas a responsabilização de sócios e administradores é exceção, e não regra, e não pode ser entendida como tal, muito menos em desprestígio dos princípios constitucionais.
Conclui-se, portanto que, apesar dos esforços da Fazenda Pública para generalizar a responsabilidade tributária dos sócios, esta só resta configurada nos estreitos limites traçados pela legislação, em observância, principalmente, ao princípio da legalidade estrita do Direito Tributário.
Responsabilidade tributária no art. 124 do CTN
A Fazenda Pública está se aproveitando da redação pouco clara do art. 124, do CTN para tentar imputar a responsabilidade de débitos tributários de pessoas jurídicas a terceiros que não realizaram o fato gerador tributário ou que não se vinculam a ele diretamente, tais como sócios, empresas do mesmo grupo econômico e até mesmo parceiros negociais.
Assim, tem requerido judicialmente a inclusão de terceiros no pólo passivo de execuções fiscais e emitido certidões de dívida ativa com o nome destes terceiros já impresso.
Contudo, o fato de ser sócio de uma empresa, ou uma relação financeira, de grupo econômico ou a realização de negócios jurídicos, simplesmente, não é hábil para impor solidariedade tributária, pois o dispositivo aludido não tem a extensão e alcance pretendidos pela Fazenda.
O conceito de solidariedade advém do Direito Civil, segundo o qual há solidariedade quando em uma relação jurídica obrigacional há mais de um credor ou mais de um devedor, cada qual detentor de todo o direito ou obrigado à totalidade da dívida (14) .
No Direito Tributário, a solidariedade não pode ser presumida nem pode decorrer da vontade das partes, mas sempre advém de norma expressa da legislação. Ainda, no Direito Tributário só se admite a solidariedade passiva, ou seja, por parte dos devedores, pois não se concebe mais de um ente público como titular de um mesmo crédito fiscal. Neste caso, se um dos devedores realiza o pagamento do crédito tributário, sub-roga-se no direito de credor em relação aos demais que com ele são solidários.
Como as disposições relativas à solidariedade referem-se a situações extraordinárias, é necessário que sejam interpretadas com cuidado, para que seus limites não sejam violados, sob pena de indevida ampliação de seu alcance.
No Direito Tributário, há dois tipos de solidariedade passiva explicitados no art. 124 do CTN. O inciso I trata da solidariedade natural, reunindo pessoas que tenham interesse comum no fato gerador da obrigação principal, em razão de realizarem conjuntamente o fato gerador. São todos eles contribuintes do imposto conjuntamente. O inciso II trata da solidariedade legal, estabelecida caso a caso por lei, vinculando pessoa que não realizou o fato gerador, na qualidade de responsável pelo seu adimplemento. Nesta hipótese, a lei objetivou a garantia do pagamento do tributo, vinculando mais de uma pessoa através da solidariedade.
O instituto da solidariedade foi criado no direito tributário para favorecer o Estado na satisfação de seu crédito, propiciando à Fazenda a escolha do devedor em relação ao qual seja mais simples, prático e eficaz exigir a integralidade da dívida, já que o parágrafo único do art. 124 preceitua que não haverá benefício de ordem entre os obrigados solidários, não havendo direito de um dos devedores pleitear que os bens de outro sejam executados anteriormente. Do contrário, a Fazenda teria que cobrar cada cota de débito de cada devedor, o que ocasionaria maior custo e empecilhos à satisfação do crédito.
De acordo com o inciso I do art. 124 do CTN, solidariedade entre os devedores é definida pelo interesse comum dos participantes na realização do fato jurídico tributário. Assim, haverá obrigação solidária entre aqueles que possuem este interesse comum mesmo que a lei específica do tributo seja omissa, pois se trata de uma norma geral.
Contudo, o conceito de 'interesse comum' não foi definido pela lei, sendo expressão vaga, imprecisa, questionável e abstrata. Não é adequada para expor com exatidão a condição em que se colocam aqueles que participam da realização do fator gerador. Portanto, é imprescindível que seu significado seja investigado.
A Fazenda tenta disseminar indevidamente que o interesse comum apto a autorizar a imputação de solidariedade seria o interesse econômico. Defende que o sócio deveria ser obrigado solidário porque tem interesse na renda da empresa, que os parceiros negociais se beneficiam do fato gerador e que as demais empresas que constituem o grupo econômico são interessadas no resultado financeiro por ele ocasionado. Contudo, esta interpretação mostra-se equivocada.
Em uma relação jurídica bilateral relativa a um fato gerador tributário, como uma compra e venda, comprador e vendedor possuem interesse na celebração do negócio, mas os interesses de ambos não são comuns, mas, ao contrário, são antagônicos, pois ocupam posições contrapostas. A solidariedade tributária somente pode existir entre sujeitos que figurem no mesmo pólo de relação obrigacional.
A interpretação mais adequada do art. 124, I para fins de existência de solidariedade tributária é aquela que considera que o interesse comum não é econômico (efetivação do negócio), e sim que se trata de um interesse jurídico.
Desta forma, o interesse comum se refere a pessoas que tenham participação no fato gerador, ou seja, que o tenham praticado conjuntamente. Se a solidariedade decorre de interesse comum, as pessoas já são naturalmente coobrigadas e a solidariedade torna-se legal por efeito da regra do Código.
Os sócios, diretores e gerentes que atuam regularmente no exercício de suas funções não podem ser considerados obrigados solidários da empresa com supedâneo no art. 124, I do CTN, porque não praticaram o fato gerador na condição de contribuinte, e, embora possam possuir interesse econômico, não têm interesse jurídico no fato gerador.
A imputação de responsabilidade tributária aos sócios pode partir dos arts. 134 e 135 do CTN caso seus pressupostos tenham sido configurados. Em relação ao art. 134, a responsabilidade se restringe à sociedade de pessoas; e, em relação ao art. 135, é necessário tenha havido prática de atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.
A responsabilidade solidária dos sócios não pode derivar simplesmente do art. 124, I, do CTN, ou seja, não existe solidariedade tributária sobre o simples fato de ser sócio. Contudo, nem sempre a jurisprudência caminha neste sentido, inclusive em julgado do Superior Tribunal de Justiça:
"Lançar na CDA a relação dos sócios gerentes, coobrigados é direito assegurado ao exeqüente, nos termos do art. 2º, § 5º, I e § 6º, da Lei de EXECUÇÃO FISCAL, constituindo, inclusive, requisito essencial à formação título executivo, à constatação da SOLIDARIEDADE, por interesse comum com os negócios da sociedade empresarial, sobretudo porque expressamente designados como tais por lei (art. 124, I, do CTN) (...)." (15)
Importante ressaltar que não é incomum a existência de empresas irregulares e de sócios de fato, ou seja, pessoas que, na pretensão de fraudar a Fazenda Pública, não constam nos contratos sociais das empresas, colocando interpostas pessoas para tal, habitualmente denominadas "laranjas". Assim, mesmo não participando formalmente como sócios das empresas, detém o seu controle agindo em desconformidade com a legislação para reverter para seu patrimônio recursos oriundos da empresa. Daí surge um questionamento: estes 'sócios de fato' poderiam ser considerados obrigados solidários sob o fundamento do art. 124, I, do CTN?
Partindo da premissa de que a solidariedade baseada neste dispositivo legal exige que tenha havido a prática conjunta do fato gerador por duas pessoas que são contribuintes, inicialmente entende-se que não seria o dispositivo legal mais apropriado para subsidiar este tipo de imputação de responsabilidade.
O art. 124, I, trata da responsabilidade natural dos contribuintes pela prática conjunta do fato gerador, enquanto que o art. 135 se baseie na ocorrência de ato ilícito pelos sócios, gerentes e administradores da sociedade. Diante disto, verifica-se que seria mais apropriada a utilização do art. 135 do CTN, desde que seja provada a condição da efetiva existência do exercício da gerência da empresa pelos sócios de fato, estejam eles mascarados por "laranjas" ou como integrantes de uma sociedade irregular.
Ou seja, preliminarmente, entende-se que, a rigor, neste caso não se está diante da solidariedade natural (art. 124, I), mas sim da solidariedade que decorre de fato ilícito, da fraude perpetrada por pessoas que efetivamente são sócias e gerentes da empresa (art. 135).
Como ensina Misabel Derzi (16) , a solidariedade não é um tipo de sujeição passiva por responsabilidade indireta, nem é uma forma de inclusão de um terceiro no pólo passivo da obrigação tributária, pois os devedores solidários não são terceiros, mas aqueles que realizam o fato gerador do tributo. Justamente por isto o Código Tributário Nacional di